O polo industrial da empresa Brasil BioFuels (BBF) continua ocupado nesta quarta-feira (6) por cerca de 30 indígenas da etnia Tembé. Os indígenas também ocuparam duas fazendas do empreendimento, que ficam na divisa Tomé-Açu e Acará, nordeste do Pará.
A ocupação dos indígenas é um ato de protesto contra ameaças às comunidades, que ficam próximas às propriedades controladas pela empresa. A empresa, que atua com o cultivo de dendê na região, alega que houve “invasão” e que “colaboradores e terceirizados foram mantidos reféns dentro de ônibus por quase duas horas”.
O protesto dos indígenas iniciou na terça-feira (5), é uma reação a supostas investidas da empresa em criminalizar as comunidades Tembé.
“Nossa única preocupação que existe agora é um conflito com os seguranças da empresa, porque eles andam armados, tentando intimidar a comunidade indígena. Essa manifestação ocorre após eles humilharem dois membros da comunidade, mas quando eles encontram o grupo todo junto, eles dão uma vítima, mas as ameaças não param. A empresa continua atacando de todas as formas, tentando nos criminalizar”, afirma.
Segundo nota divulgada pela BBF, os indígenas entraram no escritório do empreendimento e alojamentos e o caso foi registrado por meio de boletim de ocorrência.
Mediação de conflito
Na sexta-feira (1º), uma audiência da Ouvidoria Agrária da Justiça do Pará, com a presença do Ministério Público Federal (MPF), discutiu como tratar do conflito territorial entre a empresa e comunidades indígenas e quilombolas cercadas por fazendas na região de Tomé-Açu e Acará.
O MPF defende que a mediação seja tratada em âmbito federal, por se tratar de área indígena homologada e demarcada.
O procurador da República Felipe Moura Palha afirmou que considera a origem dos conflitos atuais baseada nos seguintes pontos:
- a Terra Indígena Turé Mariquita está estrangulada por plantações da empresa, sem zona de amortecimento que deveria existir de pelo menos dez quilômetros de distância entre os cultivos e a área indígena;
- não houve licenciamento ambiental da atividade da BBF
- e o povo Tembé sofre graves impactos ambientais que não foram avaliados em estudo de impacto ambiental.
Segundo Palha, a mesma situação aflige duas comunidades quilombolas, também cercadas por plantações de dendê: a comunidade Alto Acará e a Nova Betel. “Há áreas compradas pela empresa que são, na verdade, território reivindicado por quilombolas e indígenas”, afirma o MPF.
“A falha do estado do Pará no licenciamento da atividade econômica está na gênese dos conflitos. Nunca houve consulta prévia, livre e informada e não existe diálogo de boa fé sem isso, nem sem os estudos de impactos”, disse o procurador da República Felipe de Moura Palha.
Os indígenas também defendem a federalização. “Foi criado um comitê, que os indígenas e o MPF não vão participar por entenderem que se trata de uma reserva da União, portanto uma Terra Indígena homologada e demarcada, o que não seria competência do Estado julgar a situação. Ou seja, nesse comitê só estarão os órgãos competentes e a BBF, porque as comunidades tradicionais não se sentem representadas”.
Já a BBF disse que os representantes da empresa “reforçaram a necessidade de cumprimento de decisões liminares em ações de reintegração de posse de áreas de plantio na região” e que as autoridades presentes na reunião “ao serem informadas da quantidade de furtos de frutos, máquinas e equipamentos das áreas invadidas, manifestaram preocupação reforçando a necessidade de atuação imediata das forças policiais locais”.
A empresa estima perda de R$50 milhões provocada pela manifestação dos indígenas. Por outro lado, os indígenas apontam que as comunidades envolvendo indígenas, quilombolas e ribeirinhos se voltaram contra o descaso frente à contaminação, ameaças e criminalização por parte do empreendimento.
O que diz a BBF
A BBF divulgou uma nota sobre o assunto – confira na íntegra:
“A reunião convocada pelo Ouvidor Agrário Desembargador Mairton Marques Carneiro teve origem no pedido da BBF em razão da ampliação das invasões (atualmente 6 mil hectares de plantio de palma de óleo) e inúmeras subtrações de frutos, maquinários e equipamentos que já acumulam um prejuízo de mais de 50 milhões de reais.
O pleito apresentado pela BBF na reunião foi o cumprimento voluntário e pacífico de ordens judiciais de desocupação dos plantios invadidos, que são foco de atuação de associação criminosa, já tendo ocorrido a morte de três pessoas aliciadas para se aventurarem nessas áreas, sem uso de equipamento de segurança (EPIs) e sem o treinamento adequado às atividades de colheita.
O Ministério Público Federal (MPF), mesmo sendo comunicado desde novembro de 2021 sobre todas as ocorrências registradas, mencionou que, somente a partir da reunião do dia 1º de abril, começaria a avaliar a situação narrada pela empresa. A BBF entende que esse posicionamento não auxilia na resolução dos conflitos e não proporciona a pacificação na região.
Ainda que existisse algum pleito formal de ampliação de território indígena e quilombola, o que não é o caso, a empresa avalia que não há justificativas para que as autoridades deixem de agir no cumprimento da lei.”
Fonte: G1 Pará